Para Quem Fala o Monólogo?
A dramaturgia em geral, tanto as peças teatrais como os roteiros de cinema, têm grande parte de sua problemática criativa envolvendo questões relacionadas à vida interna do personagem: o pensamento, as fantasias, a imaginação, o subconsciente , o desejo. O Monólogo eleva essa problemática à máxima.
Como vimos em “Como escrever diálogos“, o ofício do dramaturgo é um constante investigar as vontades e os desejos dos personagens e “deixá-los falar”. Fala que ora revela, ora esconde mas sempre move o drama.
A Fala Solitária
Mesmo sem conhecimentos em psicanálise, você deve saber que um diálogo é um constante modificar-se e modificar o outro. Uma Pessoa diz algo que desperta um desejo no outro, esse desejo o leva a querer dizer algo e evitar dizer um outro algo. O resultado entre uma coisa e outra é a fala. Essa fala, nas mãos de um habilidoso dramaturgo, serve ao drama, ou seja, colabora para que a plateia entenda, se interesse ou participe do espetáculo.
Mas e quando o personagem está sempre só? Quando não ouve a fala de outro que desperte nada nele e nem ele em outro? É um grande desafio. Na maioria das vezes, infelizmente, é um desafio para a plateia, também.
Antes de ler esse artigo saiba mais sobre “O Que é uma Peça Teatral” e “O Presencial no Espetáculo Teatral“.
Nem tudo que não vemos da cadeira da plateia está ausente. Então, um ator sozinho, pode realizar diálogos, se o texto assim tiver sido concebido, protagonizando quantos personagens forem necessários. Isso não é um monologo. Ou seja: Monólogo define a quantidade de personagens (falantes) na cena e não de atores. Seja o espetáculo como um todo ou uma cena.
Quem conversa sozinho?
Quem conversa sozinho é o que faz o monólogo e os delirantes. O monólogo é um recurso muito comum e aceito desde os textos mais antigos como Eurípides, passando pela renascença europeia, Shakespeare, e chegando à nossa contemporaneidade, Denise Stoklos , por exemplo.
Isso acontece porque é permitido acontecer. A Plateia colabora para o sucesso desse acontecimento. O Teatro é ritualístico; os participantes sabem seu papel no jogo: Onde sentar, momento de se calar, bater palmas, ficar em pé ou se retirar. E a cerimônia se repete sempre da mesma maneira. Quando acontece de forma diferente, é a surpresa, validando a forma. Topar participar da brincadeira de faz de conta, é uma liberdade da plateia, e como ela aceitou participar do ritual, há um pacto, não formalizado, de que todos ali aceitam as condições do jogo já bem conhecido, mesmo por quem nunca assistiu à uma peça teatral.
A plateia decide acreditar no drama. Mesmo vendo o extintor de incêndios ao lado da boca de cena, ele prefere enxergar o mar, um castelo medieval ou uma floresta. Tem suas emoções estimuladas com sua própria permissão.
Ela permite o monólogo como parte desse jogo. Um jogo que cria uma realidade só dele, uma realidade onde pode-se, até deve-se falar sozinho, pois é na fala que se revela o que há dentro do personagem. Essa é uma prerrogativa do teatro. O cinema, muito mais realista, foge desse recurso permitindo que apenas os psicóticos falem só.
Quem é o Outro do Monólogo
Você pode escrever um monólogo sem precisar justificar nada e, se estiver bem escrito, a plateia vai participar. Pode buscar nas profundezas do personagem as motivações da fala e direcionar o texto para quem for o outro (ou outros) ouvintes: ele mesmo, um morto, a lembrança de alguém, um elemento da natureza (que é uma maneira de ilustrar a si mesmo ou fazer menção à lembrança de alguém). Mas aí tem a plateia.
O monólogo direcionado à plateia é um campo minado que poucos fazem com maestria. Denise Stoklos, por exemplo, faz. Mas a grande maioria de monólogos direcionados à plateia que assisti foram deprimentes (e tentaram ser engraçados), como grande parte dos chamados Stand Ups, que é “Contação de piadas”; talvez, se assim fosse chamado, menos pessoas sairiam decepcionadas ou ofendidas.
A dificuldade de escrever e montar um monólogo que fala direto com a plateia, entre outros fatores, é que pode haver uma confusão da plateia sobre quem é essa pessoa que fala e para quem fala. Agora, se for a atriz (não personagem) falando para aquela plateia, aí é palestra ou “contação de piadas”, pois ela pode até utilizar suas habilidades teatrais, mas não há teatro sem o drama.
Dicas
A Denise Stoklos nos exemplifica na prática como um solo (não monólogo. Solo determina a unidade do elenco, não de personagens) pode incluir diálogos e monólogos multidirecionais incluindo a plateia sem, em nenhum momento, dissolver o drama.
Se você vai começar a escrever textos teatrais e quer escrever um monólogo, aqui ficam minhas sugestões:
- Evite criar um personagem psicótico, pois a menos que tenha conhecimento em Psicanálise ou Psiquiatria o texto sairá fraco, sem importância e de mau gosto.
- Escolha um foco cujo discurso não se sedimente unicamente no passado.
- Se falar para a plateia, estude “Teatro Pós Dramático”, pois assim pode desconstruir a quarta parede sem precisar recompô-la às pressas caso a plateia decida invadir a cena.
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